27 de nov. de 2015

Kit Black: Viajantes de Mundos

Quarto capítulo: O Caminho da Ilusão (parte III).


-Ela é maluca…
-Totalmente.
-E está atrasada. Afinal, ela não é tão certinha…
-Se ela pegar você falando assim dela, cabeças vão rolar.
-Qual é, meu amigo, ela é uma semi-fada e não tem nem poder de teletransporte? O que é mais importante do que o teste que ela mesma criou? Nem filhos têm!
-E…?
-Como assim “e…?”, é obvio que está escondendo alguma coisa. Quer saber outra coisa? A Iris deve ser bem mais velha do que diz. Vinte e sete anos não dão para saber tudo o que ela sabe. Ela deve ter uns cem. Ou será duzentos?
-Anm…
-Você vai ver só, aquela velhota está enrolada quando…
-Quem você está chamando de velhota?
Iris apareceu atrás do tagarela inconformado, e o fez dar um pulo de susto. Um susto de parar o coração, ainda mais com a cara enfezada dela fuzilando-o com os olhos.
-Iris, como vai?
-Nós não estávamos falando de você… –contestou o outro.
-Acho que estavam sim, Path. –Iris olhou de esguelha, de modo que o rapaz começou a gritar…
-Foi ele, foi ele, eu só concordei com a “maluca”, juro pelos Deuses...
-Crós… Venha cá. Agora!



-Não entendi… Por que a Iris chamou o Crós? –Questionou Sacha.
-Provavelmente para mandar um atrevido para outro lugar bem desconfortável, via teletransporte. –Respondeu Hiei.
-Acho que foi o Kevin. Falaram que ele estava espicaçando ela desde que chegou o convite. –Sabrina contou, ao que Mitaray concordou: -Ele sempre tira onda com os outros, algo me diz que vai parar em Dragon.
-Ou em Moon Scy.
Os três se entreolharam…
-Moon Scy.
-Com certeza.
-Sem sombra de dúvida.
Os Slaiers também se entreolharam, um ponto de interrogação subentendido em cada rosto.
-Bem, amigos, este é o Caminho da Ilusão. –Mitaray apontou para uma sombra a alguns metros deles, na sua frente. Uma mata densa, escura e sombria se alastrava indefinidamente, até se perder de vista. Nada parecia com o gramado verdejante e o pequeno bosque em que estavam parados. Ela assustaria qualquer um… Diziam rumores que era viva, e quem entrasse em seu seio nunca mais sairia. Iris a escolhera principalmente por esse motivo. A mata causava tanto pavor às pessoas que seria o teste perfeito de coragem. E quem passasse por ela e chegasse ao outro lado, estaria dentro da equipe.
É claro que sua intenção não era que alguém morresse ou sumisse para sempre, e por esse motivo ela estava ali. Afinal, era uma semi-fada. Fadas entram em qualquer floresta. Devia ter arranjado um elfo ajudante também, mas vá lá…
-Aparentemente a Iris não vai voltar para nós tão cedo, então vou lhes dar uns pequenos toques. –Começou Mitaray, se dirigindo ao que parecia ser um acampamento de tropas. Devia haver uns 30 guerreiros de todos os aspectos possíveis: espadachins, arqueiros, caçadores, um pequeno grupo de cinco que lembravam um pouco os Vikings, e um ou outro membro de cavalaria, acompanhados de seus corcéis intimidadores, isso tudo numa algazarra infernal (que não devia agradar muita a Iris). –Jamais puxem assunto com os Vikings, eles são extremamente… Como posso dizer… Antipáticos. Os oficiais de cavalaria vêm do exército do Imperador. Alguns são bem orgulhosos, mas não costumam fazer mal sem ter um bom motivo. Têm alguns seres sobrenaturais aí no meio, inclusive uns dois ou três elfos. Caso precisem de ajuda, tenham certeza que eles podem ajudar. Eles estão com o grupo de arqueiros.
-Não confiem em nada que lhes disserem sobre o Caminho da Ilusão. A grande maioria das pessoas reunidas aqui nunca esteve lá dentro e, se esteve, não vai ficar por aí se gabando… –Hiei continuou o raciocínio de Mitaray. –Se precisarem de armas ou armaduras, elas estão na tenda maior. Se aprontem rápido, porque a Iris realmente detesta se atrasar. E isso eu sei por experiência própria… –Ele olhou vagamente para cima, lembrando-se de algum momento desagradável, e terminou: -Quanto ao teste em si, fiquem atentos na maior parte do tempo, não hesitem em correr muito se a situação estiver perigosa demais para vocês e, definitivamente, se acharem que não dão conta de verdade, NÃO SE SINTAM ORGULHOSOS O BASTANTE PARA ACHAR QUE NÃO PRECISAM DA AJUDA DA IRIS. Chamem, gritem, chorem, mas não esqueçam de pedir a ajuda dela. Pode ser que percam a oportunidade de ingressar na equipe, mas se ignorarem esse último aviso, eu garanto que terão uma morte muito dolorosa…
-E eu gostei de vocês, então detestaria ver as suas vidas desperdiçadas…
-Seus corpos despedaçados…
-Até mesmo algum mísero membro fora do lugar. As pessoas que conseguem voltar geralmente deixam uma parte do corpo para trás… –Mitaray contou, entrando na algazarra.
O pequeno grupo de viajantes parou imediatamente depois dessa afirmação.
-Ele disse morte dolorosa? –Perguntou Sacha, se escondendo atrás de Ken.
-E que as pessoas não costumam voltar inteiras. –Ajuntou Kira, maliciosamente, mas logo vendo a gravidade da situação. –Isso não me parece muito bom.
Cloe preferiu não dizer nada, mas o seu rosto foi tomado por uma palidez flagrante. Hiei, que se preparava para seguir o amigo e dar no pé, percebeu. Não era justo deixá-los preocupados antes da hora. Cutucou-a de leve e alegou de um jeito que os outros pudessem ouvir: -A última parte é um pouco de exagero… Menos a questão da Iris. Não esqueçam. –Mitaray com certeza voltaria para avisar desse detalhe, ele não precisava ter parado… O que não admitiria para si mesmo era o pequeno fato de que estava fazendo aquilo exclusivamente pela garota “nerd”, que caminhava do seu lado, e acabava de dar um suspiro de alívio.
Logo, porém, o suspiro virou um chamado: -Gente, a Alyson… Kit deu no pé.
Ken, Kira e Sacha estacaram simultaneamente e olharam ao seu redor para ter certeza. Guerreiros atarefados passavam de um lado para o outro, e nenhum sinal de Kit.
-Onde foi parar aquela maluca? –Questionou Ken, já se preparando para ir procurá-la.
-Tipo assim, o Crós a puxou depois de voltar “sabe-se lá de onde” enquanto o Mitaray começava com os “toques” dele. –Contou Hiei. –Mas não precisam se preocupar, nesta algazarra toda o melhor lugar que ela poderia arranjar era ao lado dele. Estar com Crós e quase como estar com os Deuses… A menos que ele esteja usando teletransporte…
-Têm ideia do que ele quer com ela? –Questionou Cloe.
Hiei deu de ombros: -Talvez convencê-la a não entrar com vocês.
-Como sabe que ela quer participar do teste junto com a gente? –Kira disparou.
-Dedução lógica… Era o que eu faria se estivesse no lugar dela. –Ele respondeu, e se afastou, enquanto dizia: -Se não nos encontrarmos antes de entrar no Caminho da Ilusão… Boa sorte!
-Para vocês também. –Cloe desejou.
Kira se dirigiu a ela: -Eles disseram que iam fazer o teste também?
-Dedução lógica. Mitaray deixou isso bem claro quando disse “Não, bobo, ela vai CONOSCO para montar acampamento e fazer pizza”.
-Que memória, hein? –Alegou Sacha. –Eu nem tinha reparado nisso.
-Muito menos eu. –Disse Ken.
-Vamos logo, pessoal, ouviram o que o Hiei avisou: a Iris não gosta de atrasos. A Kit está bem, maninho, temos que começar a nos preocupar com nós mesmos antes que seja tarde demais para isso. –Lembrou Kira, dando um tapinha na cabeça do irmão.
-Tá legal, tá legal, vamos. Qual das tendas ele disse que era a das armas e armaduras, mesmo?
-A maior.
-Você daria uma ótima secretária, Cloe. –Ele admitiu.
-Quem sabe eu pense nisso se conseguir sair dessa confusão toda.
-Sabem outra que resolveu dar no pé? Aquela fadinha… –Cortou Sacha, agora reparando na falta da voz baixa e fina que os seguiu o caminho inteiro, do portal até ali.
-Sabrina? Deve ter ido com o Mitaray. Ela é daqui. Sabe se virar. –Cloe deduziu, e tomando a dianteira, chamou os outros: -Vamos. Acho que a tenda das armas e armaduras é aquela ali…



-Ai… O que você quer, não podia ser menos paranoico, os outros podem estar preocupados comigo. –Reclamou Kit, enquanto era sentada a força numa cadeira de madeira imensamente desconfortável. Perto dela havia um Viking “desgarrado”, que parara de afiar o grande machado e se concentrara nela. Aliás, no decote provocante que ela usava, e no que estava por baixo…
Crós percebeu o olhar e rosnou em advertência: -Cai fora!
O homem se levantou. Kit temia que ele fosse revidar. O machado imenso em sua mão poderia cortá-la em dois sem muito esforço. O tamanho dele era ameaçador, devia ter quase o dobro da massa de Crós, e era puro músculo. Ele fez uma carranca feia, encarando o feiticeiro por alguns segundos, e se foi. Ela não conseguiu refrear um suspiro de alívio.
-Você é louco. Puramente louco.
-Esqueceu que sou um feiticeiro? Acabo com três deles com um golpe só… São trogloditas, que não têm estratégia alguma. Primeira lição: -Se quer vencer um feiticeiro, precisa ter uma estratégia. Ou então ser um feiticeiro tão bom quanto seu adversário, ou bem melhor que ele.
-Crós…
-…?
-Muito obrigada. Por tudo.
Ele simplesmente sorriu e passou a mão na cabeça dela. –Você é uma boa menina. Sinto por ter que estar nessa situação.
-Mas não é o meu destino…
-Eu sei, eu sei. Além disso, também gostei de ter conhecido você, sabe? Mas seu papel nessa história não será fácil, e temo que você correrá um risco muito grande de perder muitas coisas. De descobrir coisas terríveis que a farão questionar sobre o que você realmente é.
-Você sabe muito mais dessa história do que aparenta, não é?
-Não tem a menor ideia do que eu sei sobre isso… Do que sei sobre você. Mas tudo tem uma hora para se revelar. Você precisa estar preparada para receber certas… notícias. E temo que ainda não é essa hora.
-Vai me contar quando chegar a hora, não vai?
-Farei o possível para que saiba da minha boca.
-Que bom… Uma pergunta.
-Diga.
-Se os Vikings são tão… Trogloditas, como você diz, porque eles estão aqui?
-Vieram do Mundo da Imaginação atrás do líder. Ele é que foi chamado. Ele jurou nos ajudar se algo corresse errado. –Ao ver a cara de interrogação de Kit, ele explicou: -Juramento vindo de batalhas antigas… Ele pode não ser muito melhor que seus soldados, mas leva as promessas muito a sério. Ainda estou me perguntando se isso é bom ou ruim. Enfim, não pudemos ignorá-lo, e muito menos os quatro subordinados que vieram junto. Mas pode ficar tranquila. Vikings são excelentes marinheiros e forças destrutivas perigosas, mas não têm a menor capacidade de atravessar nem os primeiros 20 metros do Caminho da Ilusão. –E, abaixando a voz, garantiu: -Eu me certifiquei disso, antes de sair para buscar você.
-Que ótimo!
-Agora, voltando à questão do teste…
-Droga, pensei que você ia esquecer.
-De certas coisas, não se esquece.
-Não adianta, Crós. Não vou deixar que entrem sozinhos…
-Tá, tá que seja. Mas você está pensando apenas com o coração. Isso pode ser bom e tudo mais, mas você também precisa usar essa coisa dentro da sua cabeça chamada CÉREBRO. –Ele retrucou, dando um cutucão na testa dela. -Por acaso acha que eles não vão dar conta?
-Não… mas… é que…
-Quer mostrar sua lealdade? Se retratar? Acha de verdade que eles não conseguirão?
-Você repetiu a última pergunta… Não acho que…
-Então responda.
-Não sei ao certo. Por que tantas perguntas?
-Estou tentando fazer sua mente trabalhar. Como acha que se sentiriam se souberem que você não acredita neles?
-Eu acredito.
-Então prove! Deixe-os ir. É a missão deles. Eles precisam passar por isso. Pense por esse ângulo: mesmo que se torne uma das guerreiras mais poderosas dos três mundos, acha mesmo que vai poder estar sempre com eles?
-Provavelmente não…
-É isso que não consegue ver. Eles precisam estar preparados. Precisam enfrentar certas batalhas por conta própria. E, se isso não for motivo suficiente, lhe apresento o inicial.
-Acreditar?
-Ter fé. Acreditar, por si só, nunca basta. –e chegando mais perto e segurando as mãos dela, continuou. –Eles necessitam disso… Desse encorajamento. Precisam saber que confia neles.
-E se não funcionar, Crós? E se eles se machucarem, ou pior…
O feiticeiro arqueou levemente as sobrancelhas e pareceu pensar por alguns instantes. Kit realmente achou que ele ia ter um ataque nervoso a qualquer momento. Mas ele apenas abriu um sorriso, mostrando dentes brancos, levemente afiados e dizendo com um tom brincalhão: -Culpe o anjo da guarda…

   

-Ta aí uma coisa que não se vê todo dia…
-Você está indo bem… Mas agradeço se apontar esta coisa pra outro lado. –Argumentou Ken, saindo da reta de uma flecha de ponta extremamente aguçada, apoiada em um arco de madeira reluzente e desconhecida, seguro pelas mãos de…
-Sacha, dá pra virar esse arco para outro canto? Se for pra eu morrer hoje, que seja pelo menos uma morte honrada. -Retrucou Kira, girando uma espada na mão. Ela lembrava um pouco uma katana, uma espada samurai, mas era um pouco mais larga, e tinha um punho ornamentado por pedras negras e vermelhas. Era uma herança de família, assim como a espada que Ken usava (a dele era uma versão um pouco mais bruta), e era sua arma favorita.
-Se continuar brincando com essa espada, vai acabar se machucando feio. –O rapaz avisou, vendo a arma rodar rapidamente pelos dedos da irmã, e temendo que ela escapasse e fosse parar no pescoço de alguém.
-Relaxa, irmãozinho. Está tudo sob controle…
A espada cravou-se a alguns centímetros da cabeça de um elfo, quase a decepando.
-Desculpe, Al.
O elfo, que tinha longos cabelos ruivos e olhos de uma cor clara e indefinida, puxou a espada e caminhou até Kira, devolvendo-a e contestando: -Percebe-se que você não precisa de treino…
Ela respondeu com um sorriso largo. –Viu, nem arranquei sua cabeça…
-Pois é. –E, com delicadeza, tirou o arco das mãos de Sacha. –Prefiro que vocês mirem nos inimigos, não em mim.
-É pedir demais. –Kensuke ajeitou a bainha da espada em suas costas, passando por cima de sua meia armadura, que não fizera questão de tirar, e embainhando em seguida a própria espada, de punho prateado e lâmina terrivelmente afiada. –Mas tente pedir de novo quando alguém aparecer sem cabeça.
Cloe, que agora vestia uma armadura de aço negro e estilizada (e no momento lembrava uma amazona das lendas gregas), fez o chicote escuro que estava em sua mão oscilar antes de repetir: -Ta aí, uma coisa que não se vê todos os dias. Quem em sã consciência daria uma arma para Sacha? Não que você seja louco, Alberich, mas…
-Eu sei. Só sei. -O elfo abaixou as orelhas, num sinal de conformismo.
-Não sou tão ruim assim. –Protestou a ruiva, lançando um olhar pedinte a Alberich.
Ele lhe respondeu com ar de descrença: -Não diga…
-Ei, acho que o Crós resolveu largar a Kit por alguns instantes…
Cloe apontou para frente. Um pequeno corpo se esquivava dos guerreiros, abrindo caminho por entre a confusão.
-Até que enfim… Pensei que você tinha sido raptada. –Argumentou Sacha.
Kit revirou os olhos, juntando-se a eles. –Crós queria me dar uns toques. –E curvando os ombros, resignada: -Não vou entrar com vocês.
-Não!?
-Não.
-Ele torturou você ou o quê? –Ken chegou mais perto e colocou a mão sobre a testa dela.
O olhar enviesado que recebeu de baixo fez com que se afastasse novamente.
-A resposta é não. –retrucou a jovem, de cara feia. Suavizando um pouco o rosto, continuou: -Decisão própria. Só agora percebi.
-O quê?
-Sou capaz de dar um voto de confiança. –Ela sorriu.
-Não deveria. A situação está um tanto quanto critica… –O elfo riu brevemente.
-E você é?
-Alberich. Alberich de Helm. Elfo, rastreador, arqueiro e bússola ambulante.
Helm. Isso soava muito familiar.
-Kit. Kit Black.
-Ah, eu sei, acredite… Foi muito bom conhecê-los, pessoal, mas temos um teste a realizar. Nesse exato instante.
Ele nem terminou de dizer isso quando um barulho de gongo passou pelo acampamento improvisado, fazendo com que entrasse num silêncio súbito e repentino. Os Slaiers se viraram a tempo de presenciar um agradecimento cortês de Iris a Mitaray, que mantinha o grande porrete com que golpeara o gongo em mãos e agora suspirava um “disponha”.
-Amigos e amigas presentes aqui nesse momento. –Iris, começou, elevando a voz fina para poder ser ouvida. –Todos sabem o porquê de estarem aqui hoje. Agradeço desde já a ajuda que muitos de vocês deram a Equipe Black nesse instante difícil no qual nos encontramos. Porém, as coisas estão para piorar ainda mais, e creio que nosso contingente não é grande o suficiente para lidar com elas. Devo afirmar que, agora, nossa querida Kit está entre nós –A semi-fada fez um gesto em direção a garota, que se encolheu, extremamente sem graça. 30 cabeças convergiam pra ela instantaneamente. – Vocês sabem o quanto ela é importante, mas quero lembrar que é apenas uma adolescente. Eu sei que isso tudo pode ser muito novo pra ela. Portanto, não podemos sobrecarregá-la com uma missão que é nossa.
Caros amigos, nós nos reunimos hoje para, não só aumentar a Equipe Black, mas dar as boas vindas pra essa fantástica garota que, mesmo sabendo muito pouco, se propôs a vir aqui e nos ajudar”.
Agora, ao nosso teste”.
Esse, como todos vocês sabem muito bem, é o ‘Caminho da Ilusão’. Nele, nada é o que parece. As regras são simples: quem chegar até o outro lado, vence e se junta a nós. Sei que muitos de vocês me julgaram mal por isso, talvez disseram que era injustiça, mas eu lhes garanto que é necessário. Eu própria buscarei quem se perder. Não se preocupem, se depender de mim, ninguém morrerá ou se perderá hoje”.
O que ela não sabia era que aquilo já não estava mais em suas mãos.
Iris puxou o ar para os pulmões visando continuar quando sentiu uma sensação estranha. Mau pressentimento. Um frio repentino lhe desceu pela espinha. Respirou profundamente. Não era nada. Não devia ser.
-A preferência é que entrem pelo menos quatro pessoas juntas. É mais fácil pra resolver certos… Problemas. Caso precisem de ajuda, gritem o meu nome. Crós fez um feitiço de localização bem eficaz… Os que forem ajudados por mim, estão fora da competição. –E, antes que chegasse aos seus ouvidos os protestos, ela replicou: -Entrem quando o gongo bater. Não tem prazo para chegada, mas eu advirto que, passar um dia inteiro na floresta, pode não ser uma experiência muito agradável.
Mais uma vez uma onda de vozes iradas se levantou da pequena multidão. Iris lançou um olhar significativo a Mitaray.
O rapaz ergueu o porrete, mirou bem e golpeou o gongo com toda a força que conseguiu reunir. E, mais uma vez, fez-se silêncio.
-Boa sorte, pessoal.
Os participantes demoraram um pouco pra chegar a uma conclusão, e quando chegaram foi quase simultaneamente. Em instantes, o acampamento estava quase vazio. Os únicos que permaneceram foram os slaiers, Mitaray, Hiei, os elfos (que se recusavam em bancar os estabanados), Iris e Crós.
Kit inclinou levemente a cabeça, fitando os amigos: -Vocês têm certeza?
-Temos.
-Prometam que vão tomar cuidado.
-Claro que vamos. –Argumentou Cloe. –Temos coisas a fazer. E deixar você aqui sozinha pra virar isca de uma imortal assassina não está nos planos.
-É, se vamos botar a água pra ferver, colocamos ela toda. –Kira girou sua espada e a embainhou. –Se você é tão importante pro meu irmão como ele diz ser, tem todo o meu apoio.
-Apoio triplicado. –Suspirou Sacha. –Por mais que eu vá me arrepender disso depois.
Kit Black sorriu de novo. Fidelidade. E diziam que não se encontrava mais isso hoje em dia.
Hiei e Mitaray desceram para se juntar a eles. O segundo puxou Kit pelo braço delicadamente e perguntou: -Você vem?
-Não. Não mesmo.
Mitaray sorriu. –Boa garota. –E, passando a mão nos cabelos dela argumentou: -Pode deixar. Vou cuidar bem deles por você.
-Sério?
Ele revirou os olhos: -Mas é claro. Palavra de caçador.
-Vocês dois são caçadores?
-Não exatamente… Mas fica melhor pra você entender. –Dirigiu-se aos outros para avisar: -Vamos, o tempo está correndo. Devemos sair de lá antes do cair da noite.
-Por quê? –Questionou Kira.
-Digamos que tem coisas que aparecem por aqui à noite que não são recomendáveis de se esbarrar. Acham que dão conta pelo menos da primeira parte do Caminho sozinhos?
Ken, Cloe, Kira e Sacha trocaram olhares.
-Talvez…
-Sim.
-Moleza.
-Não sei, não…
Crós ignorou o comentário de Sacha. –Vão logo, quanto mais tempo demorarem a entrar, pior vai ser para sair.
-Vocês quatro vão na frente. Nós protegemos a retaguarda. Portanto, tentem sobreviver pelo menos uma hora. Depois disso, os gritos das pessoas mais despreparadas já vão ter parado, e talvez possamos encontrar vocês novamente. –Mitaray disse enquanto apontava para frente.
-Belo plano. –Resmungou Kira.
-Gritos? –Sacha repetiu, engolindo em seco. Olhou em volta. Os elfos já haviam sumido, ficando apenas Alberich. Provavelmente entraria com Mitaray e Hiei. Fez as contas. Um, dois, três… Peraí, Iris não tinha recomendado quatro integrantes?
Ela não sabia, mas cada um dos três valia como dois.
Manteve-se perto de Ken enquanto ele entrava na floresta, junto com as outras, e lançava um último olhar para Kit: -Eu vou voltar. Prometo.
-Eu acredito… em vocês. –Murmurou para si mesma, Kit. E então eles sumiram por entre as primeiras árvores.
-Acho que agora somos nós, certo? –Alberich suspirou, enquanto pendurava o arco em seu ombro.
-Anime-se, colega de orelhas pontudas, isso será divertido. –Foi a vez de Hiei argumentar.
Mitaray se limitou a espreguiçar-se. Kit reparou que agora ele levava nas costas algo como…
-Uma foice?
O rapaz olhou para ela. –Sim?
-Você carrega… Uma foice.
Ele lhe lançou um sorriso sutil. –Ela é muito útil. E tem uma história um tanto… Complicada.
Kit levou seu olhar até Hiei. Podia não ter uma foice, mas um báculo esquisito girava em suas mãos. E ela podia jurar que gravado no material negro do qual era feito, havia uma caveira fitando-a com suas órbitas vazias. De cada lado de seu crânio, saíam asas angelicais da mesma cor, fechando-se em torno da face descarnada.
Aquilo fizera gelar seus ossos. Sentiu a mão quente de Mitaray tocando seu ombro. –Relaxe. Ele gosta de chamar mais a atenção. Não é o que parece.
Ela encontrou os olhos cinza do rapaz e chegou à conclusão que, realmente, estava sendo ridícula. Ela tinha certeza de que, jamais, aqueles dois iriam machucá-la. Ao ver eles e Alberich lhe lançarem um tchau e entrarem no Caminho da Ilusão, tinha certeza que teria mais três seres naquela floresta para os quais rezaria.

Contudo, não havia abandonado aquela sensação inicial. Foice, uma caveira… Seria apenas ela que associara aquilo com sua amiga, Dona Morte?

~Kit Black

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